sábado, novembro 26, 2005

QUANDO A POLITICA CHEIRA MAL - DE QUEM E' O DINHEIRO?

AS RAZOES DA FOME DO POVO ANGOLANO
[Publico na integra um artigo que fez scalpor em Angola]



A conexão Angola do valerioduto Jailton de Carvalho - O Globo



BRASÍLIA - As investigações sobre o valerioduto devastaram o núcleo central do governo Lula, atravessaram o Atlântico e, agora,
podem se transformar num campo minado também para o governo do presidente de Angola, José Eduardo dos Santos. Na busca dos tentáculos internacionais do empresário Marcos Valério de Souza, os investigadores do caso esbarraram em 21 remessas do Trade Link Bank, uma off-shore com sede nas Ilhas Cayman, para o ministro das Finanças de Angola, José Pedro de Morais Júnior, e para o presidente do Banco Nacional (o Banco Central daquele país), Amadeu de Jesus Castelhano Maurício, dois dos principais integrantes da equipe econômica de Santos. No total foram remetidos para contas das duas autoridades cerca de US$ 2,7 milhões.

Com estreitas ligações com o Banco Rural, o Trade Link Bank está no centro das investigações sobre o suposto mensalão do PT para parlamentares da base, o mais rumoroso escândalo do governo Lula. Mas isso não significa que o valerioduto mandou dinheiro para Angola. O que investigadores acreditam é que o dinheiro enviado para as autoridades angolanas apenas pegou
carona no mesmo esquema de movimentação de recursos no exterior.

Os papéis não registram quem são os pagadores que recorreram ao Trade Link. Mas os investigadores consideram as operações suspeitas e estão apurando, em sigilo, supostos vínculos de empresas brasileiras, beneficiárias de contratos milionários em Angola, com os políticos locais. Os investigadores querem saber quem autorizou as transferências de recursos e por que o esquema recorreu a uma off-shore com sede num paraíso fiscal para fazer pagamentos expressivos a importantes dirigentes políticos.

Pelos extratos bancários obtidos com a quebra do sigilo bancário da Trade Link nos Estados Unidos, a off-shore fez 20 remessas no valor aproximado de US$ 2,6 milhões para contas do ministro Pedro de Morais entre 2003 e este ano. As remessas variam de US$ 76 mil a US$ 360 mil. Os documentos oficiais registram que, só em 2003, a Trade fez 12 transferências para Morais no valor de US$ 1,4 milhão.

Os recursos saíram de uma conta do Trade Link, no Banco Standard, em Nova York, e seguiram até uma conta em nome de Morais no Banco Internacional de Crédito (BIC), em Lisboa, Portugal. A estratégia mudou nos dois últimos anos, quando a off-shore repassou US$ 1,2 milhão em oito parcelas a Morais. Em operações mais complexas, o dinheiro saía de contas da Trade Link no Standard ou no banco Wachovia e passava pelo BIC, em Lisboa, antes de voltar para uma conta em nome de Pedro Morais no Bank Fund Staff, em Washington.

As relações da Trade Link com integrantes do governo de Angola não param por aí. Nos extratos da off-shore consta uma remessa de US$ 176 mil para Amadeu Castelhano, a mais alta autoridade monetária de Angola, no dia 12 de março de 2002. O dinheiro saiu da conta da Trade no Standard, passeou pelo Banco Africano de Investimentos, do outro lado do Atlântico e, depois do giro internacional, voltou a uma conta em nome de Amadeus, no Citibank, em Nova York.

A Trade e o Rural são dois dos principais alvos das investigações de uma força-tarefa do Ministério Público Federal, da Polícia Federal,
no Paraná, da CPI dos Correios e até da Promotoria Pública de Nova York. As investigações começaram em 1996, no início do caso Banestado, e recentemente se cruzaram com as apurações em curso na CPI dos Correios. Os parlamentares descobriram que Valério usou a Trade Link para fazer 11 remessas de cerca de US$ 900 mil para a Dusseldorf, off-shore do publicitário Duda Mendonça com sede nas Bahamas e conta no Bank Boston, em Miami.

Procurados pelo GLOBO na sexta-feira, José Pedro de Morais e Amadeu de Jesus não foram localizados. O chefe da assessoria de imprensa do Ministério das Finanças, Bastos de Almeida, disse que Pedro de Morais só deve se manifestar depois da publicação da reportagem. Bastos disse que nada sabe sobre as supostas
transações de Pedro de Morais com a Trade Link. Mas alega que, pela legislação angola, administradores públicos podem receber até 15% do valores dos negócios que ajudam a concretizar.

- Há pagamentos que são legais. Nem tudo é corrupção - afirmou Bastos.

Esta não é primeira vez que um escândalo político brasileiro atravessa a fronteira e bate às portas de Luanda. Em 1992, o atual diretor da Polícia Federal, delegado Paulo Lacerda, instaurou um inquérito para investigar negócios suspeitos do empresário Paulo César Farias, ex-tesoureiro do então presidente Fernando Collor de Mello, com empresários e políticos angolanos.
Ao longo das investigações, Lacerda recolheu documentos mostrando que as empreiteiras Odebrecht e a Servia, duas gigantes do setor, repassaram US$ 7,2 milhões para PC Farias. As duas empresas tinham fortes interesses nas obras de reconstrução de Angola, devastada pela guerra civil. A Odebrecht estava interessada na construção de Capanda, a maior
usina hidrelétrica do país. A Servia ambicionava abocanhar os contratos de construção de casas populares.

Parte das obras de Capanda seria bancada com recursos de uma linha de crédito especial de US$ 80 milhões do Comitê de Financiamento às Exportações, do governo brasileiro. Após o impeachment de Collor e a morte de PC Farias as investigações perderam força.



Corrupção é fantasma antigo

O Globo

A corrupção é uma velha conhecida de Angola, que este ano celebra seu 30 aniversário como nação independente amargando o
indesejável título de 151 país mais corrupto do planeta (entre 159 pesquisados, quanto mais alta a colocação, pior a classificação), segundo o relatório anual do Centro de Pesquisa na Internet sobre Corrupção, mantido pela Universidade de Passau, na Alemanha, e pela Transparência Internacional.

Há anos esta organização aponta as principais áreas de corrupção no país, governado desde 1979 pelo presidente José Eduardo dos Santos, do MPLA: petróleo e gás, construção civil e armas. Responsável por 60% do PIB do país - e por 90% do Orçamento do Estado - o petróleo é de longe o setor que mais rende o que a Transparência chama de "pagamento de comissões ocultas".

Em 2002, uma grande reportagem do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (Ciji), organização baseada nos EUA, revelou como funciona o esquema em que o dinheiro público vai parar em contas privadas de membros do governo. Segundo a organização, economistas estimaram que somente em 2000 até US$ 1 bilhão
podem ter sido desviados dos US$ 6,9 bilhões em petróleo que o país exportou - US$ 2,9 bilhões pela estatal Sonangol.

Num dos casos mais emblemáticos, US$ 13,7 milhões foram depositados pela Marathon Oil Company em 15 de julho de 2000 - segundo o Ciji - numa conta da Sonangol no paraíso fiscal de Jersey, na Europa. A soma representaria um terço do bônus que a companhia americana concordou em pagar à angolana por direitos de exploração de petróleo em Angola. No mesmo dia, afirma o Ciji, a Sonangol transferiu soma idêntica à depositada para uma outra conta em local desconhecido. No mesmo ano, grandes somas ainda foram transferidas de Jersey para contas de uma companhia privada de propriedade de um ex-ministro angolano, uma fundação de caridade do presidente
José Eduardo dos Santos e para um banco privado que tem entre seus donos um homem acusado de negociar armas ilegalmente.

Outro sumidouro de dinheiro público, segundo a Transparência Internacional, são os empréstimos garantidos por petróleo, pagos com recursos que fogem ao controle dos fiscais orçamentários.

A organização defende a idéia de que as companhias internacionais devem assumir responsabilidade por sua contribuição à corrupção sistêmica em Angola e em outros países da África. Algumas companhias, como a Shell, a Texaco e a Occidental Petroleum, concordaram em assinar um documento intitulado Princípios Sullivan, um código de conduta para firmas que operavam na África do Sul. Mas o Ciji alerta para o fato de que a adoção de um código de ética não significa a garantia de negócios transparentes. "Sejamos realistas. Nenhuma companhia de petróleo que procurar negócios na África pratica um código de ética e princípios transparentes de modo a ter uma vantagem
competitiva sobre os concorrentes", argumentou Ho Wang Kim, funcionário do escritório de Angola da companhia Energy Africa.

Tal realidade levou o deputado Ed Royce, presidente da subcomissão para a África da Comissão sobre Relações Internacionais, a cobrar mais transparência nos negócios do petróleo com Angola e outros países em audiências da Câmara dos Representantes dos EUA em 2002: "A prática de fazer vista grossa enquanto os rendimentos do petróleo são gastos de forma equivocada não é boa (...) para os africanos, e no fim das contas, é um mau negócio para as companhias."



Buratti diz que ‘República de Ribeirão Preto’ buscou negócios em Angola

Ex-assessor de Antonio Palocci na Prefeitura de Ribeirão Preto, o advogado Rogério Buratti afirmou em depoimento ao Ministério Público que o empreiteiro José Roberto Colnaghi conseguiu fechar negócios em Angola com a ajuda do ministro da Fazenda. No depoimento, revelado pela revista “IstoÉ Dinheiro” deste fim de semana, Buratti contou que também tentou, em vão, firmar contratos naquele país. Colnaghi é quem teria emprestado seu avião para o transporte de dólares vindos de Cuba para a campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O depoimento de Buratti foi dado na segunda-feira, na presença do promotor Aroldo Costa Filho e de um assessor da CPI dos Bingos, de acordo com a revista. Nele, Buratti disse que foi a Luanda, capital de Angola, em 13 de agosto de 2003, tentar conseguir um contrato para a empresa Leão Leão na área de concessão de obras e serviços públicos. O advogado deve prosseguir seu depoimento nesta semana,
como parte do acordo para reduzir sua pena pelos crimes de fraude em licitações, formação de quadrilha e evasão de divisas.

Palocci suspeito de negociar doação de angolanos

A “IstoÉ Dinheiro” e a “Veja” deste fim de semana afirmam também que Palocci teria intermediado uma doação de R$ 1 milhão de empresários angolanos ligados aos bingos.

Enquanto a “Veja” diz que a intermediação foi denunciada por uma testemunha secreta, a “Dinheiro” atribuiu a acusação a Buratti. Em depoimento na semana passada à CPI dos Bingos, o advogado disse que o ministro da Fazenda tinha conhecimento da doação, mas não chegou a apontá-lo como intermediário no negócio.

O acordo para a doação teria sido fechado num jantar na casa do empresário Roberto Kurzweil, com a presença do ministro e de Ralf Barquete, que foi secretário de Finanças de Palocci na Prefeitura de Ribeirão Preto. O empresário teria recolhido a primeira metade da remessa, de R$ 500 mil, e a repassado ao
então tesoureiro do PT, Delúbio Soares, por meio de Barquete. Kurzweil alugou dois automóveis Omega para o PT na campanha presidencial de 2002 — e um deles também teria sido usado no transporte dos supostos dólares doados por Cuba.

Angolanos seriam donos de fábrica e mina de diamantes

Os empresários angolanos são identificados como Artur José Valente de Oliveira Caio e José Paulo Teixeira Cruz Figueiredo, o Vadinho. A “Veja” diz que eles são sócios da Fábrica Brasileira de Máquinas Automotivas (Fabama), que produz equipamentos para bingos, enquanto que a “IstoÉ Dinheiro” afirma que os dois são donos de casas de bingo e possuem nacionalidade portuguesa. A revista especializada em economia também afirma que ambos são donos de uma mina de diamantes em Angola, têm negócios no México e nos Estados Unidos e moram em Miami.


As declarações de Buratti à CPI dos Bingos reveladas pela revista “Veja” sugerem que Palocci — que foi o coordenador da campanha de Lula à Presidência em 2002, no lugar do prefeito assassinado de Santo André, Celso Daniel — pode ter participado do esquema de arrecadação de recursos clandestinos. A prestação de contas eleitorais da campanha de Lula não registra doação de bingos.
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