quarta-feira, setembro 22, 2004

Concentração excessiva de poderes pode ser perigosa



William Tonet
A Constituição de qualquer país e Angola não pode fugir à regra, não deve ser um fato ajustado a uma pessoa concreta.

Ela tem de ser abstrata nas suas linhas, nos seus propósitos e nos objectivos, que todos aqueles que forem levados, a dado momento, a desempenhar funções, por via dos processos democráticos, nas mais altas instituições do Estado devem obedecer, respeitar e cumprir.



Entretanto o absurdo neste ante-projecto continua a ser a transformação de um homem normal, num super homem, dotado de poderes quase divinos, pois só assim se entende que o primeiro-ministro, não seja o chefe de Governo, porquanto este exercício compete, também, ao Presidente da República (artº 162).

Este artigo é uma inovação, pois na actual Constituição, as funções do Presidente como chefe do Governo são omissas e, talvez por isso, já tenha merecido um acordão do Tribunal Supremo, nas vestes de Tribunal Constitucional.

Assim caso venha a ser aprovado este ante-projecto a situação do primeiro-ministro, será mais com-plicada porquanto caberá ao Presidente da República, enquanto chefe de Go-verno, dirigir e orientar a acção do primeiro-ministro, dos ministros, dos gover-nadores de província e de-mais membros do aparelho do Estado. É coisa para se perguntar como poderá jus-tificar o salário que aufere, quando não desempenha qualquer tarefa de realce.

Fica pois no ar o que se entende por governar e o princípio de cumpliciade e sinergias que deveriam ter as distintas instituições públicas. Governar e administrar aqui se confundem em funções de mercearia.

"Mas, rigorosamente, gover-nar tem um sentido que se dilata no tempo, para além dos limites individuais de quem governe, imper-ceptível, portanto, para os adventícios do poder.

A noção plena de Governo liga-se às responsabilidades dos seus efeitos, que recaem longe".

Entretanto o artº 160 encerra as funções do Presidente da República, que vão desde a alínea a) a y), percorrendo, na prática, todas letras do abecedário e conferem-lhe o poder de nomear o primeiro-ministro, convocar e marcar eleições, dirigir mensagem à Assembleia Nacional, nomear quase todos os membros das instituições do Estado, entre outras.

Isto é pois um autêntico absurdo por misturar tudo, numa constituição como se o seu valor estivesse no número de artigos, que bem poderiam repousar em sede própria e ao objecto concreto dos seus institutos.

Mas paradoxalmente aqui se confunde governar com reinar, como se o País estivesse refém de um homem só. Reinar, no caso concreto, de Angola, parece não ser deixar administrar, ou de governar, mas qualquer coisa de "supra-governo" em potência", concentrado no Palácio presidencial. E aqui ninguém parece alertar para os perigos de um absolutismo legal, poder criar instabilidade governativa, se as previsões de vitória de uns falharem. Este vício tem sido pernicioso para o País e a prova das imoralidades podem verificar-se nos empreéstimos contraídos no exterior, que hipotecam o País e endividam as gera-ções futuras.

A pretensão de se configurar uma soberania superior, nas mãos de uma instituição, não parece ter em linha de conta as rotas exigidas para o despontar do desenvol-vimento de Angola amanhã. E o perigo é das mais novas gerações não conseguirem, hoje, ter as leituras pertinentes que a defesa da sua sobrevivência impõem.

Os bajuladores e idola-tradores, muitas vezes, nos seus comentários, acham positivo o excesso de concentração de poderes e interferência a todos os níveis do Presidente da República, que inibe e banaliza a actuação do primeiro-ministro.

Apesar de se acreditar haver uma intromissão abusiva e perturbadora, nas compe-tências exclusivas do Gover-no.

Procedendo desta forma o primeiro-ministro é quase uma marionete, nas mãos do Presidente da República, que obedece a todas as suas orientações, uma vez estarem esvaziadas, na Constituição as suas competências e não temos por isso que comentá-las, no actual quadro de um partido com maioria, um Presidente da República e um primeiro-ministro.

Porém, o que merece, e requere, uma observação pertinente é a ideia implícita de todos "cobardemente" concordarem com este esvaziamento institucional que faz um primeiro-ministro desinteressar-se dos problemas do País.

Mais grave ainda é estar configurado, que um partido que ganhe as eleições legislativas, não possa indicar um primeiro-ministro, para este chefiar o Governo, pois estas funções e indicações serem da exclusiva competência do Presidente da República.

Com este artifício fica esvaziado a realização das eleições legislativas, que passam a ser um verdadeiro empecilho, onde as forças políticas vão gastar dinheiro, mas não podem ambicionar, que uma eventual vitória lhes confira a aspiração de mudar o rumo dos acontecimentos

De princípio ninguém de bom senso, pode aceitar a indiferença de um primeiro-ministro quanto ao rumo nebuloso dos rumos da gestão governativa.



fonte:folha8

Sem comentários:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...

Postes populares